TEMER: OUTRO PRESIDENTE PARA OS MESMOS PROBLEMAS
A reforma política se tornou mais do que nunca fundamental. A
redução do número de partidos e o fim das coligações proporcionais são questões
da maior urgência.
O governo que
se anuncia hoje está longe de ser um governo de união nacional. Para além
de qualquer análise sobre a regularidade ou não do processo impeachment,
vou me concentrar nos desafios que o governo
Temer deve enfrentar nos próximos meses para construir uma coalizão e
garantir governabilidade.
Considero que o governo Temer terá
sérias dificuldades de governabilidade, não apenas por causa da
mobilização dos movimentos sociais e da base de apoio do governo Dilma,
que aparentemente não pretende dar trégua ao novo governo. Mas,
exatamente, em virtude dos elevados custos de transação para a formação de
uma coalizão no Congresso atualmente.
Parte dos meios de comunicação de
massa e da sociedade brasileira acredita que o impeachment da presidente
Dilma Rousseff será o fim de uma crise política muito dura. Sustentou-se
que o ponto central da crise era a presidente Dilma Rousseff e sua notória
inabilidade política, incapacidade de diálogo e de condução da grave crise
econômica que o país enfrenta.
Sou cético em relação a esta
narrativa. Penso que o problema que vivemos tem profundas raízes
institucionais e que escapa completamente da capacidade pessoal de diálogo
de um presidente ou de sua habilidade política na construção de uma
coalizão de governo.
O presidencialismo de coalizão chegou
a um patamar onde os custos de formação de uma coalizão são tão elevados
que impossibilitam a governabilidade. Vou me concentrar em três pontos:
1) Os custos de transação para a
formação de coalizões tem sido cada vez maiores, pois o nível de
fragmentação partidária tem elevado significativamente a necessidade de
coalizões. Nesta legislatura, por exemplo, o maior partido na câmara
não tinha sequer 14% das cadeiras na Câmara dos Deputados.
A ciência política já constatou a
elevação do custo das coalizões especialmente a partir do primeiro governo
Lula no qual a fragmentação partidária se elevou bastante em comparação aos governos
de FHC. A fragmentação partidária seguiu ascendendo no segundo governo
Lula e no primeiro governo Dilma nos quais as coalizões foram amplas e
bastante heterogêneas.
Estes elevados níveis
de fragmentação repercutem diretamente no nível de vulnerabilidade
do presidente, o que também explica parte da incapacidade de Dilma
de construir uma coalizão estável.
2) Para além destes custos da
fragmentação partidária, mais facilmente captados pela ciência política, é
preciso agregar outros custos que metodologicamente são mais difíceis de
capturar: a crônica dependência do presidencialismo de coalizão da
distribuição de ministérios, cargos e da manutenção de uma série de
práticas ilícitas para a construção e manutenção das coalizões.
Há uma falsa impressão de que os
escândalos de corrupção envolvendo recursos públicos desviados de
empresas estatais se constituem em uma prática política do PT. Há setores
na oposição, na imprensa e até no judiciário que reproduzem esta
visão partidarizada dos eventos.
É um engano considerar que este tipo
de prática não está vinculada estreitamente ao presidencialismo de
coalizão. A distribuição de cargos, ministérios e empresas estatais a
partidos se tornou essencial para a sobrevivência da coalizão no Congresso.
Sempre se soube que coalizões tão
amplas e heterogêneas não poderiam se formar por identificação ideológica
ou programática, logo também não é possível mais acreditar que estes
escândalos não tenham raízes institucionais e que se trata apenas de um
modus operandi de um partido.
3) Há também um elemento conjuntural
que considero ser importante para a elevação dos custos de uma coalizão: O
clima de salve-se quem puder que existe hoje no Congresso.
Muitos parlamentares estão
seriamente envolvidos em escândalos de corrupção, os levantamentos variam
na quantidade de parlamentares envolvidos em esquemas, mas é certo
que parte significativa do Congresso tem problemas com a justiça.
A operação Lava Jato e a Zelotes
já evidenciaram a participação de inúmeros parlamentares e a prioridade de
muitos é salvar-se das garras do STF, do juiz Moro e da Polícia Federal.
A sensação de que o foro privilegiado
não garante impunidade a mais ninguém está presente entre
os parlamentares. Desde a prisão do senador Delcídio e do afastamento
de Eduardo Cunha esta sensação está nas alturas.
Garantir proteção também será
parte crucial de qualquer acordo de apoio ao governo o que tende a elevar
ainda mais os custos, pois este parece ser um preço que nenhum governo tem
condições de pagar.
Somando-se os três fatores considero
que os custos de formação de uma coalizão foram elevados à estratosfera.
Diante disso, qual a capacidade que o governo Temer tem de formar uma
coalizão estável?
O governo já nasce com baixa
popularidade e com problemas de legitimidade interna e externa e
isso tende a retroalimentar a ingovernabilidade e ampliar dificuldade de
aprovar medidas polêmicas no Congresso. Não há mais como apelar para as habilidades políticas
e pessoais de um presidente para construir uma coalizão nestas condições.
A reforma política se tornou mais do
que nunca fundamental. A redução do número de partidos no Congresso e o
fim das coligações proporcionais são questões da maior urgência. Temo que
estes problemas não sejam resolvidos ou encaminhados em um governo Temer.
*Vanuccio
Pimentel é doutor em Ciência Política (UFPE) e professor universitário.
Fonte: http://www.cartacapital.com.br/politica/governo-temer-outro-presidente-para-os-mesmos-problemas
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