“Moro e Dallagnol ainda vestem fraldas
na ciência do Direito. São guiados por preconceitos e pela cegueira da política
sobre o Jurídico”. Docente e pesquisador há 30 anos investigou a vida acadêmica
de Moro e Dallagnol e encontrou inúmeras inconsistências
por
Marcos César Danhoni Neves*
Sou professor
titular de Física numa universidade pública (Universidade Estadual de
Maringá-UEM) desde 2001 e docente e pesquisador há quase 30 anos. Sou
especialista em história e epistemologia da ciência, educação científica, além
de processos de ensino-aprendizagem e análise de discursos.
Orientei mais
de 250 alunos de graduação, especialização, mestrado, doutorado e
pós-doutorado, além de professores in-service. Conto tudo isso, como preâmbulo,
não para me gabar, mas para salientar que li milhares de páginas de alunos
brilhantes, medianos e regulares em suas argumentações de pesquisa.
Dito isso,
passo a analisar duas pessoas que compõem o imaginário mítico-heróico de nossa
contemporaneidade nacional: Sérgio Moro e Deltan
Dallagnol.
Em relação ao
primeiro, Moro, trabalhei ativamente para impedir, junto com um coletivo de
outros colegas, para que não recebesse o título de Doutor honoris causa pela
Universidade Estadual de Maringá.
Moro tem um
currículo péssimo: uma página no sistema Lattes (do CNPq – Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico ligado ao extinto MCT – Ministério da Ciência e
Tecnologia). Lista somente 4 livros e 5 artigos publicados.
Mesmo sua
formação acadêmica é estranha: mestrado e doutorado obtidos em três anos. Isso
precisaria ser investigado, pois a formação mínima regulada pela CAPES-MEC
(Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Ministério da
Educação) é de 24 meses para Mestrado e 48 meses para o Doutorado.
Significa que
“algo” ocorreu nessa formação apressada.. Que “algo” é esse, é necessário
apurar com rigor jurídico.
Além de
analisar a vida acadêmica de Moro para impedir que ele recebesse um título que
não merecia, analisei também um trabalho seminal que ele traduziu: “O uso de um
criminoso como testemunha: um problema especial”, de Stephen S. Trott.
Mostrei que
Moro não entendeu nada do que traduziu sobre delação premiada e não seguiu nada
das cautelas apresentadas pelos casos daquele artigo.
Se seguirmos o
texto de mais de 200 páginas da condenação do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, e guiando-me pela minha experiência em pesquisa qualitativa, análise de
discurso e fenomenologia, notamos claramente que parte significativa do texto
consiste em Moro tentar apagar suas digitais, sem sucesso, ao desdizer que agiu
com imparcialidade.
Nestas páginas
robustas lemos uma declaração clara de culpa: Moro considera a parte da defesa
de Lula em menos de 1% do texto total! E dos mais de 900 parágrafos, somente
nos cinco finais alinhava sua denúncia e sentença sem provas baseada num misto
frankensteiniano de “explanacionismo” (uma “doutrina” jurídica personalíssima
criada por Deltan Dallagnol) e “teoria do domínio do fato”, ou seja, sentença
exarada sobre ilações, somente.
Aqui uso a
minha experiência como professor e pesquisador: quando um estudante escreve um
texto (TCC, monografia, dissertação, tese, capítulo de livro, livro, ensaio,
artigo), considero o trabalho muito bom quando a conclusão é robusta e costura
de forma clara e argumentativa as premissas, a metodologia e as limitações do
modelo adotado de investigação.
Dissertações e
teses que finalizam com duas ou três páginas demonstram uma análise rápida,
superficial e incompetente. Estas reprovo imediatamente. Não quero
investigadores apressados, superficiais!
Se Moro fosse
meu aluno, eu o teria reprovado com esta sentença ridícula e persecutória. Mal
disfarçou sua pressa em liquidar sua vítima.
Em relação a
outro personagem, o também vendedor de palestras Deltan Dallagnol, há muito o
que se dizer. Angariou um título de doutor honoris causanuma faculdade privada
cujo dono está sendo processado por falcatruas que o MP deveria investigar.
O promotor
Dallagnol não seguiu uma única oitiva das testemunhas de defesa e acusação de
Lula, além daquela do próprio ex-presidente.
Eu trabalho em
pós-graduações stricto sensu de duas universidades públicas: uma em Maringá e
outra em Ponta Grossa. Graças a isso fui contactado por meio de um coletivo
para averiguar a dúvida sobre a compra por parte de Dallagnol de apartamentos
do Programa Minha Casa Minha Vida em condomínio próximo à UEPG (Universidade
Estadual de Ponta Grossa).
Visitei os
imóveis guiado por uma corretora e me dirigi ao Cartório de Registro de Imóveis
da cidade. Após algumas semanas, a resposta: os dois apartamentos
modestíssimos, destinados a gente pobre, tinham sido adquiridos pelo Promotor e
estavam à venda com um lucro líquido em menos de um ano de aquisição de 135 mil
reais.
Reuni o
material e disponibilizei para a imprensa livre (aqui a matéria
do DCM). O promotor teve que admitir que comprou os apartamentos
para ganhar dinheiro na especulação imobiliária, sem resquícios de culpa ou de
valores morais em ter adquirido imóveis destinados a famílias com renda de até
R$ 6.500,00 (Deltan chegou a ganhar mais de R$ 80.000,00 de salários – além do
teto constitucional, de cerca de R$ 35.000,00; e mais de R$ 220.000,00 em suas
suspeitosas palestras).
Bom, analisando
os discursos de Dallagnol, notamos claramente a carga de preconceito que o fez
construir uma “doutrina” de nome exótico, o “explanacionismo”, para obter a
condenação de um acusado sem prova de crime.
Chega a usar de
forma cosmética uma teoria de probabilidade – o bayesianismo – que ele nem
sequer conhece ao defender a relativização do conceito de prova: vale seu
auto-de-fé a qualquer materialidade de prova, corrompendo os princípios
basilares do Direito.
Como meu aluno,
ou candidato a uma banca de defesa, eu também o teria reprovado: apressado,
superficial e sem argumentação lógica.
Resumindo:
Dallagnol e Moro ainda vestem fraldas na ciência do Direito. São guiados por
preconceitos e pela cegueira da política sobre o Jurídico.
Quando
tornei-me professor titular aos 38 anos, eu o fiz baseado numa obra maturada em
dezenas e dezenas de artigos, livros, capítulos, orientações de estudantes e
coordenações de projetos de pesquisa.
Infelizmente,
estes dois personagens de nossa República contemporânea seriam reprovados em
qualquer universidade séria por apresentar teses tão esdrúxulas, pouco
argumentativas e vazias de provas. Mas a “Justiça” brasileira está arquitetada
sobre o princípio da incompetência, da vilania e do desprezo à Democracia.
Neste contexto,
Moro e Dallagnol se consagram como “heróis” de papel que ficariam muito bem sob
a custódia de um Mussolini ou de Roland Freisler, que era o presidente do
Volksgerichtshof, o Tribunal Popular da Alemanha nazista. Estamos sob o domínio
do medo e do neo-integralismo brasileiro.
*Marcos César Danhoni Neves é professor titular da
Universidade Estadual de Maringá e autor do livro “Do Infinito, do Mínimo e da
Inquisição em Giordano Bruno”, entre outras obras.

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