AS SEMELHANÇAS ENTRE O GOLPE DE 2016
NO BRASIL E O GOLPE NAZISTA EM 1933
Hitler
deu um golpe inteiramente "legal" em 1933, através de uma votação no
Parlamento, com o apoio da classe média alta. Naqueles idos, na Alemanha,
rasgou-se a Constituição "legalmente". Se olharmos os métodos do
Brasil em 2016, como se parecem...
Muito se tem escrito,
contra e a favor, sobre semelhanças e diferenças entre o golpe nazista de 1933
e o que hoje está em curso no Brasil.
Bom, vamos começar
por alguns personagens principais. Ninguém de bom senso vai comparar o tacanho
e tragicômico Michel Temer com o trágico e sinistro Adolf Hitler. Nem um nem
outro merecem tanto. Aquele, “do lar”, este, bem, também era “do lar”,
abstêmio, vegetariano, fiel pelo que se sabe, mas, de qualquer modo e por
exemplo, os penteados eram completamente diferentes. Além disto, Hitler ficou
no poder durante doze anos, de 33 a 45, digamos. Temer não ficará tanto. No
Inferno de Dante Hitler estaria na boca de Lúcifer, mascado com os grandes
traidores da história. Onde estará Temer? Provavelmente na porta do Inferno.
Nem lá ele será admitido. Na porta, sem direito nem a meia-entrada, estão os
que carecem até mesmo de um forte caráter pecador. Para alegria dos
pós-modernos, estão no não-lugar universal e eterno.
Também ninguém vai
comparar o grotesco Cunha ao também grotesco Göring, que foi quem presidiu a
sessão do Reichstag que começou o golpe de estado nazista em 23 de março de
1933. Se estivessem num romance de Dostoyevski, ambos seriam qualificados como
psicopatas. Mas não esteve um, nem está o outro. Vamos aguardar para ver como a
história qualificará o mais recente deles. Boa coisa não será.
Agora, se olharmos os
métodos, como se parecem!
Em primeiro lugar,
Hitler deu aquilo que a revista alemã qualificou, em relação ao Brasil, um “kalter
Putsch”, um “golpe frio”, ou “branco”, na nossa tradição. Foi um golpe
inteiramente “legal”, através de uma votação no Bundestag, o Parlamento, depois
confirmado pelo Bundesrat, que equivaleria ao nosso Senado (como deve
acontecer), assinado pelo presidente von Hindenburg, e largamente deixado
correr ou apoiado pelo Judiciário.
O golpe ganhou o nome
histórico de “Ermächtigungsgesetz”, que poderia ser traduzido por “Lei de
Empoderamento”. Era muito breve, como o nosso Ato 5: tinha um preâmbulo de
algumas linhas e cinco artigos. Em essência, dizia que o Gabinete Executivo –
presidido por Hitler – tinha poderes para decretar leis sem aprova-las no
Parlamento, e que estas leis estariam acima da Constituição, que não poderia
ser invocada para contestá-las. Dizia que a exceção se referia ao Bundestag e
ao Bundesrat, coisa que, evidentemente, foi desrespeitada depois. Ou seja, como
hoje no Brasil, rasgava-se a Constituição “legalmente”, e abria-se o período de
exceção, diante de uma pequena burguesia (hoje diríamos alta classe média)
gessificada pelo medo da ascenção dos “debaixo”. Mas tanto lá como hoje, nesta
classe média isto não era unânime, diga-se de passagem. Por isto a repressão
que se seguiu foi generalizada. E hoje, não será?
Mas houve também o
processo de votação. Como o nosso presidente da Câmara, Göring se dedicou a
criar regras próprias para a votação. Depois do incêndio do Reichstag, no final
de fevereiro de 1933, Hitler desejou que na nova votação que haveria no começo
de março ele tivesse assegurada uma maioria absoluta no Bundestag. Isto não
aconteceu. O Partido Nacional-Socialista precisava ainda do apoio de partidos
de coalizão (basicamente o Partido do Centro, católico – parecido com os
evangélicos de hoje – e o Partido Nacional do Povo Alemão, coligado com os
nazistas. Por isto os nazis decidiram adotar o caminho da Lei do Empoderamento,
para prescindirem deste apoio futuramente. E os outros morderam a isca.
Mas houve mais. A
Constituição alemã previa que para uma votação destas, que a modificava, era
necessária a presença de dois terços dos deputados, ou seja, 432 dos 584
membros. Para vencer esta dificuldade, Göring inventou uma nova conta. Como os
comunistas tinham sido acusados pelo recente incêndio do prédio do Reichstag (o
Parlmento se reunia num teatro, a Casa da Ópera Kroll), os deputados do KDP
(Kommunist Deutsche Partei) tinham sido presos, banidos, ou estavam foragidos.
Assim Góring simplesmente descontou os 81 que eles eram da soma geral, e o
quorum ficou reduzido a 378. Boa matemática, não?
Além disto, Göring
abriu as portas do Parlamento aos Nazisturmabtellung, os SA, Camisas-Pardas
(que depois seriam sacrificados para ratificar o poder dos SS). Hoje, no
Brasil, não há SA, mas há as tratativas entre a presidência da Câmara e a Rede
Globo, fazendo a votação no domingo, com esta mudando horários de jogos… enfim,
cada momento tem a SA que pode e merece.
O processo de votação
foi uma farsa. Estaremos falando de 1933 ou de 2016? Tanto faz. Aquele não foi
transmitido pela TV, porque TV não havia, pelo menos na escala de hoje. O de
hoje foi, para vergonha dos deputados perante o mundo inteiro. Vários deputados
do SPD tinham sido presos, ou já haviam fugido para o exterior. Mas o inventivo
Göring criou uma nova cláusula, ad hoc: deputados que não comparecessem, mas
que não tivessem apresentado uma justificativa por escrito, deviam ser contados
como presentes, para para garantir o quorum. (Lembram da alegação de um um
deputado pró-impeachment que os deputados ausentes teriam de apresentar atestado
médico?).
Bom, na sessão,
apenas o líder do que restava do SPD, Otto Wels, que terminaria morrendo
exilado na França antes da ocupação, falou contra a nova Lei. Os outros
discursos foram acachapantemente ridículos (alguma coincidência será mera
semelhança?). Bom, ninguém invocou a mãezinha ou o vizinho, mas saíram coisas
como a Pátria e a Ordem. Resultado: 444 a favor da nova lei, 94 contra, todos
estes do SPD.
Um detalhe muito
interessante: Hitler negociara com Ludwig Kaas, o líder católico, que respeitaria
o direito da Igreja e os funcionários católicos nos cargos de Estado, além das
escolas. No dia seguinte ao da votação, que foi logo aprovada no Bundesrat e
assinada por Hindenburg, Ludwig Kaas foi despachado para o Vaticano para
explicar a nova situação ao então Cardeal Pacelli, futuro Papa Pio XII, de
triste memória (alguma semelhança com a viagem do ex-companheiro Mateus, hoje
senador Aloysio Nunes Ferreira, despachado aos States logo depois da votação na
Câmara?) Ele cumpriu a missão religiosamente, como o Mateus. Porém, Hitler lhe
prometera (a Kaas) uma carta com as garantias. Ela nunca foi entregue.
Satisfeitas e satisfeitos? É, mas tem mais…
Porque ainda resta o
triste papel do Judiciário. Em primeiro lugar, juízes alemães legalizaram a
perseguição aos comunistas porque eram “traidores” incendiários do Reichstag.
Depois, fizeram vista grossa para as demais perseguições que vieram. Quando não
apoiaram. Deve-se lembrar que quem inaugurou a queima de livros em 10 de maio
de 1933, na hoje Bebelplatz, foi o diretor da Faculdade de Direito, ao lado,
trazendo uma braçada de livros “degenerados” da sua biblioteca.
Hitler acusou um
comunista holandês, Marinus Van der Lubbe, e mais quatro outros militantes
búlgaros pelo incêndio, que ocorreu em fevereiro de 1933, alguns dias antes da
eleição de março. Eles foram levados a julgamento no segundo semestre de 1933.
Lubbe foi réu confesso – sabe-se lá como sua confissão foi obtida, mas pode-se
julgar pela declaração em juízo de um dos outros acusados, Georgi Dimitrov, de
que passara sete meses acorrentado em sua cela, dia e noite. Bem, a gente pode
pensar numa justificativa: naquela época não havia delação premiada… Era
pancadaria mesmo. Os outros quatro foram absolvidos por falta de provas, mas
Lubbe foi condenado à morte e executado no começo de 1934.
Farsa? Sim, mas o pior vem depois.
Em 1967 um juiz da
Alemanha Ocidental, na reabertura do processo promovida pelo irmão do
condenado, Jan, “comutou” a pena de van der Lubbe de condenação à morte para 8
anos de prisão (!), quando o réu já estava, bem, digamos, no outro mundo. Em
1980, novo julgamento anulou a decisão de 1933 e de 1967. Mas em 1983 nova
decisão anulou a de 1980, a pedido do… Ministério Público (!). O caso só foi
resolvido definitivamente em 06 de dezembro de 2007 (!), 71 anos depois da
decisão original, quando o equivalente ao nosso Promotor Geral da República
proclamou “o perdão” de van der Lubbe, com base em uma lei de 1998 que
declarara todas os julgamentos da época do nazismo juridicamente nulos.
Até hoje as alegações
de que o incêndio foi provocado pelos próprios nazistas para começar sua série
interminável de desmandos nunca foi oficialmente investigada. É um bom exemplo
para quem acha que o caso das omissões e vagarosidade do Judiciário brasileiro é
algo único na história.
Depois deste
exercício de história comparada, que as leitoras e os leitores tirem suas
próprias conclusões.
Assista os vídeos:
O Golpe Nazista: A Classe
Média e a Alta Burguesia
O golpe nazista e o apoio da plutocracia
O Golpe Nazista: Maioria
Parlamentar e o Bloqueio da Democracia
O Triunfo do Golpe Nazista:
A Desunião das Esquerdas
Fonte:
http://www.pragmatismopolitico.com.br/2016/08/as-semelhancas-entre-o-golpe-de-2016-no-brasil-e-o-golpe-nazista-em-1933.html

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