O
narcisismo na contemporaneidade: o mal estar da era das “selfies”
Texto de Natali
Maia Marques
A intenção é trazer uma reflexão sobre as famosas “selfies”, o
que acontece com esse ciclo vicioso que estão se tornando. Pensar através de
conceitos e teorias da psicologia e psicanálise para entender tal fenômeno na
contemporaneidade, se não vivemos uma “neurose das selfies”, uma vez que
neurose esta relacionada com a questão da compulsão e repetição.
Sigmund Freud, o criador da psicanálise, teorizou sobre o
conceito de narcisismo, em sua obra Introdução ao Narcismo, trazendo questões
importantes sobre o desenvolvimento do sujeito que ainda podem ajudar a
pensarmos no meio em que vivemos, para que uma pessoa consiga estabelecer bons
vínculos sociais, é necessário que durante o período da infância, a criança se
sinta amada principalmente pelas figuras familiares, ou seja, caracterizando
como fundamental o olhar e troca/investimento afetivo.
Com isso, de acordo com a teoria freudiana, é normal e esperado que o
narcisismo esteja presente no desenvolvimento de todos nós, mas a forma como é
vivenciado na infância influenciará nas outras fases da vida de cada um. Por
exemplo, caso ocorra investimento narcísico em excesso o indivíduo poderá ficar
voltado demais para si mesmo, e possivelmente terá dificuldades de estabelecer
vínculos mais profundos.
Em relação à mitologia grega, Narciso era aquele que ficou
conhecido pela sua beleza e também pela impossibilidade de se contemplar, pois
segundo o mito, isso lhe renderia vida longa. Mas ao ver-se refletido nas águas
de uma fonte, ele se apaixona por si. E em busca desse amor impossível, Narciso
funde-se consigo mesmo e sucumbe na própria imagem. Trazendo para o atual
contexto, podemos ver tal mito nas tecnologias, principalmente com o uso das
redes sociais, e a tão falada “selfies” (substantivo originado de self, “eu” em
inglês) não estariam ligadas apenas na intenção de se expor, através de fazer
um auto-retrato, mas também uma busca pelo elogio e olhar do outro de ser
admirado reconhecido, e assim, amado.
O que é muito discutido atualmente, seria se toda essa exposição
e busca revela um sintoma da sociedade, cada vez menos interessada nas relações
de fato e reais, á medida que apenas investe na proliferação de imagens, que
não necessariamente traduzem o sentido real, ou seja, se o indivíduo de fato
esta feliz e bem. Mas nessa busca por ser admirado e amado, de modo tão
instantâneo, muitas vezes sem parar refletir, sendo assim de modo mais
impulsivo, traduzem os reais sentimentos? E ao final, o indivíduo que terá
muitas curtidas e elogios realmente se sentirá melhor?
Acredito que esse sentimento perdura um curto período de tempo,
é instantâneo, e por isso, novamente a pessoa precisa postar outra e outra e
mais uma “selfie”, para ter mais curtidas e mais elogios, pra de novo “estar
bem”, virando um ciclo vicioso, uma tornando-se, assim, uma “neurose” se há uma
compulsão da repetição, daquilo que nunca é atingido, por isso a compulsão
(postar constantemente uma selfie) para evitar o sentimento de vazio,
possivelmente quando o indivíduo começa a entrar em contato com a sensação do
vazio instantaneamente “tirar uma selfie”, e novos elogios virão. E não seriam
isso as “selfies”, um vício, uma repetição pela busca deste sentimento de
“felicidade”, em ser “admirado ou amado”?
Fica a reflexão por uma dificuldade também da pessoa de estar
sozinha, com os próprios e reais sentimentos, sejam eles bons ou ruins, ou de
pode estar em contato com outro, configurando um mal-estar na era das
“selfies”. Dessa forma, cada vez mais as relações se tornam superficiais, ou
seja, quando se esta realmente em contato com o outro o indivíduo pouco expõem
o que deseja, sente, pensa, pois esta tão voltado para a sua “selfie”, pra si
mesmo, como diz Caetano Veloso “Narciso odeia tudo aquilo que não é espelho”, e
a “selfie” nada mais é do que uma forma de espelho!
Assim, a pessoa nem se reconhece mais no olhar do outro, não
sabe mais o que busca e como no mito, pode sucumbir na própria admiração. Além
das fotos de si mesmo, também é muito compartilhado os momentos vividos, mas
realmente vivê-los é necessário!
Por
fim, como as redes sociais poderiam ser diferentes e mais úteis também? E se
cada um começasse a postar mais os seus interesses, informações culturais, a
compartilhar projetos sociais importantes, e não somente o seu próprio retrato,
mas sim, o que esta por trás da “selfie”, quem realmente é, e como pode ajudar
a sociedade em que vive, que com certeza, não será através da postagem de
milhares de fotos de si mesmo. A necessidade de construirmos uma sociedade
menos individualista e egoísta, que cada vez mais nos tornamos, e sim que as
redes sociais possam ter, principalmente, uma função de contribuição à
sociedade!
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