terça-feira, 15 de julho de 2014

Financiamento Público de Campanha

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Financiamento Público de Campanha



Acabo de ler o artigo do Prof. Walter Marcos K. Birkner publicado no jornal Correio do Norte, edição de 09 de Maio de 2014, intitulado: “Financiamento de Campanha”. Brilhante professor. Sociólogo liberal descentralizado. Seus argumentos se apresentam sibilinos. Incomodam. Desacomodam.  Não há o que discordar de seu raciocínio.  Mas, talvez se possa dar continuidade a tais provocações argumentativas, chamando atenção a aspectos correlacionados. É o que tentaremos fazer neste artigo, sem a pretensão de alcançar a intensidade das reflexões do Prof. Walter.  Observamos a recorrência em períodos pré-eleitorais, anteriores e recentes, o tema do financiamento de campanha, apresentando-se às luzes da ribalta. Desta, vez o judiciário (STF) decidiu. Decisão que escancara a interdependência dos três poderes. Ou dito de forma diferente, sobretudo, o esvaziamento do legislativo.

É uma constante que nas democracias ocidentais o executivo legisle por meio de “Medidas Provisórias” e, que o legislativo ratifique as imposições legislativas do executivo.  Este “estado de exceção”, em que o executivo legisla e governa se tornou técnica de governos que se arrolam o título de democráticos. Este “estado de exceção” não se apresenta como exclusividade do Estado brasileiro. Mas, em nossas terras, talvez se possa afirmar que ele ganha contornos específicos. Também o judiciário legisla. E o que faz o legislativo federal? Intensifica barganhas com o executivo. Mais verbas parlamentares para alimentar currais eleitorais. Para garantir os nichos eleitorais que conduzirão deputados e senadores à reeleição.

Na constituição do Estado moderno, alicerçado na independência dos três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário, o legislativo é o poder com maior grau de importância. O legislativo é o lócus por excelência das demandas sociais, dos interesses dos diversos grupos e organizações que compõem o tecido social de uma nação.  Legislar, elaborar leis que respondam as demandas da dinâmica social é (seria) sua atribuição primeira. Fiscalizar as ações do executivo, conferir parecer aprovando, ou recomendando alterações aos projetos do executivo também é tarefa do legislativo. Mas, parece que o legislativo brasileiro não legisla suficientemente. Prefere negociar com o executivo a aprovação de medidas provisórias, transferindo ao poder executivo a tarefa de legislar. Em matérias, em que o que está em jogo é a manutenção desta situação, no caso a “reforma eleitoral”, transfere para o judiciário a tarefa de legislar e decidir.

O que se evidencia é a renúncia do legislativo às funções que lhe são inerentes, a sua condição de poder independente, barganhando com o executivo, verbas do orçamento da União, de prerrogativa exclusiva do poder executivo em sua administrabilidade.  Grave distorção na correlação de forças dos três poderes de estado. Caracteriza relação de dependência entre os três poderes.  Aumento desproporcional do poder judiciário. Judicialização das esferas da vida, da política, da economia.  Estado de exceção como técnica de governo, como prerrogativa do poder executivo, legislando freneticamente através de medidas provisórias. A isto chamamos de democracia.  O filósofo italiano Giorgio Agamben, nos chama atenção de que foi no seio dos Estados democráticos do início do século XX, que se afirmaram experiências totalitárias do estado nazista, fascista e, stalinista.  Seguramente não é o caso do Estado brasileiro, mas os princípios operacionais dos três poderes, que constituem nossas democracias se assemelham àquelas trágicas experiências de governo. Agamben vai mais longe, ao afirmar que não sabemos do que estamos falando quando afirmamos que estamos vivendo em sociedades democráticas.
Prezado leitor, não há culpados para justificar as contradições e imposições que você acaba de ler. Apontar culpados é manifestação de miopia é pretender compreender o fenômeno pela sua instrumentalidade operacional, desconsiderando os fundamentos do problema, qual seja: “O esvaziamento da política”.  A politóloga alemã Hannah Arendt, definiu política como a esfera privilegiada de ação entre os seres humanos na garantia do bem comum.  Ao abrirmos mão da ação, abrimos mão da política. Quando partimos da visão parcial e diminuta de que a política é coisa para políticos, de que a política não presta, ou é coisa para desonestos e corruptos, então o pior dos mundos se apresenta. Nesta condição infernal, o que se quer é que o bem (poder judiciário) diga o que deve ser feito. Obedecer é mais fácil. É condição pueril. Agir politicamente exige comprometer-se em praça pública. Encerro este artigo com o pai da política moderna Nicollo Maquiavelli: “A política não nos garante o céu, mas nos livra do pior dos infernos”.  Financiamento de campanha não se resolve com decreto do judiciário, mas com o avanço da capacidade política dos brasileiros de pensar e debater livremente os interesses comuns do Estado, da nação.

Sandro Luiz Bazzanella

Professor de filosofia da Universidade do Contestado. Líder do Grupo de Pesquisa Interdisciplinar em Ciências Humanas (Cnpq). Lider do Grupo de Estudo em Giorgio Agamben. Coordenador do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional;
 

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