segunda-feira, 11 de maio de 2015

REFLEXÕES SOBRE OS 100 PRIMEIROS DIAS DE 2015 (II) DE ÁRVORES E FLORESTAS


Reflexões sobre os 100 primeiros dias de 2015 (II)
De árvores e florestas

   Localizar-se em meio a uma floresta quando se está perdido não é tarefa que se possa realizar de forma afoita. Ao observar excessivamente as árvores perde-se a compreensão da floresta em sua variedade de espécies e, em sua disposição topográfica. Ao observar apenas a floresta
desconhece-se a diversidade e a disposição das árvores na composição da mata. Em qualquer uma das iniciativas a possibilidade de andar em círculos e não alcançar o destino almejado é significativo. Talvez, esta metáfora ajude a explicar o fenômeno da agressividade verbal expressa por parte das pessoas, sobretudo nas redes sociais em relação às lideranças políticas que governam o país. Tais posicionamentos e formas de expressão não contribuem para qualificar a democracia que tanto se reivindica como solução para todos os problemas públicos e privados inerentes a constituição da sociedade brasileira. Mas, também se pode conjecturar que formas agressivas de expressão demonstram o desconhecimento do que de fato é ou pode ser uma democracia, que transcende qualitativamente a mera opinião pública motivada e potencializada pela intensidade dos meios de comunicação de massa.
Ainda nesta direção, talvez seja oportuno observar, que parte significativa destas pessoas talvez não possam ser caracterizadas como vozes que expressam posicionamentos da ultra-direita, ou paradoxalmente de uma direita “radical”, se é que ainda faz sentido falar de direita e de esquerda no contexto de hegemonia da economia política financeirizada global em que estamos vivendo. Talvez sejam vozes que se expressam a partir da observação das árvores. Suas rancorosas expressões representam a incapacidade (muito bem distribuída no senso comum dos brasileiros) de reconhecer e compreender o que de fato está acontecendo.  Ou seja, de que participar de uma democracia requer que se tenha presente a constante tensão nas relações de poder entre os diversos grupos sociais e seus interesses no controle e condução das estruturas estatais.
A partir destes pressupostos é importante ter presente que a linha de argumentação que segue está desprovida da pretensão sobre a “verdade” dos fatos, ou de se apresentar como explicação conclusiva dos fenômenos políticos, econômicos e sociais em curso na cena brasileira. Mas, por outro lado de apresentar algumas perspectivas de análise que serão aprofundadas e debatidas nos próximos artigos desta série. Sob tais perspectivas, partimos da constatação que estamos imersos numa crise política e econômica, ou dito de outra forma, estamos em meio a uma  crise da economia-política que justificou até o presente momento a racionalidade governamental a frente do Estado brasileiro no decurso das últimas duas décadas do século XX, bem como da primeira década do século XXI. Esta crise possui uma variável estrutural que advém da crise da economia financeira global, que em 2008 se apresentou a partir da crise do sistema imobiliário norte-americano espraiando-se pelo sistema financeiro da Europa e, chegando aos mercados financeiros asiáticos, sobretudo, a China. Num primeiro momento assistimos a quebra no ritmo de crescimento dos mercados financeiros centrais, impactando sobre toda dinâmica produtiva dos Estados Unidos, dos principais países da comunidade européia e, dos países emergentes, sobretudo os Brics (Brasil, China, India, Rússia e África do Sul). Assim, inicialmente contornamos o impacto da crise com financiamento estatal do mercado interno de produção e consumo. Porém, agora nos deparamos com os limites deste financiamento pela escassez dos recursos e, por extensão da capacidade estatal/governamental de manter as linhas de financiamento. A crise financeira da economia definitivamente chegou e esta em nosso meio.
A outra variável estrutural da crise se apresenta no modelo de democracia representativa de massas. Estamos diante de um aparente esgotamento do modelo político partidário sobre os quais se estrutura e se legitima as formas de governo, demarcando insatisfação generalizada por parte dos indivíduos partícipes da sociedade da informação. Ressalte-se que esta crise não é uma exclusividade brasileira, na medida em que se manifesta em inúmeros países europeus entre outros. Indivíduos com acesso há informações apresentam-se menos tolerantes em relação a precariedades no trato com a coisa pública. Tornam-se mais exigentes com a qualidade dos serviços públicos e, com a gestão dos recursos. Também não se sentem representados por partidos, bem como não demonstram mínima intenção em vincular-se no plano das ideias e, por extensão no plano da prática a uma organização partidária. O que passa a ter sentido é a aproximação com algumas ideias, ou propostas do candidato, ideais que às vezes podem se vincular especificamente a um segmento social, como acesso a saúde, acesso ao crédito a baixos juros, ao meio ambiente, à segurança, à educação, à garantia dos níveis de consumo, entre outras.
Destas variáveis estruturais da crise desdobra-se no cenário nacional uma crise conjuntural nas seguintes direções entre outras:  a) crise do modelo político eleitoral marcado por extensas alianças de cunho pragmático em função da partilha do poder no âmbito do poder legislativo e executivo; b) crise advinda dos efeitos deletérios do processo eleitoral do 2014; c) crise da proposta governista da centralização e do protagonismo estatal marcado pelo paradoxo da distribuição da riqueza, em que por um lado remunera generosamente o sistema financeiro e, por outro distribui bolsas as camadas menos favorecidas da população; d) crise advinda da postura apática dos partidos de oposição na apresentação de propostas diferenciais ao modelo governista; e) crise advinda da precariedade dialógica do governo com a sociedade em seus diversos segmentos, com suas lideranças empresariais, sindicais, políticas; e) crise advinda do fato de que a política apresenta-se reduzida a gestão dos contratos e das garantia de segurança ao capital sobre seus investimentos e, de garantia aos indivíduos de acesso a renda e ao consumo.
Talvez se possa dizer que estamos diante do fechamento de um ciclo político e econômico, para nos mantermos alinhados com o caráter cíclico de nossa trajetória histórica. Estamos naqueles momentos em que não sabemos muito bem o que fazer, para onde ir, ou a que distância está a outra margem. Pensar, refletir e se esforçar para compreender o que de fato esta ocorrendo seguramente é a tarefa que se apresenta aos cidadãos no tempo presente.



Sandro Luiz Bazzanella
Professor de Filosofia e Coordenador do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado. Lider do Grupo de Pesquisa Interdisciplinar em Ciências Humanas – CNPq.

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