terça-feira, 28 de julho de 2015


REFLEXÕES SOBRE OS SEIS PRIMEIROS MESES DE 2015.
O QUE NOS TORNA DIFERENTES DOS POVOS DESENVOLVIDOS?


Como explicar as diferenças entre a sociedade brasileira e sociedades desenvolvidos como a sociedade norte-americana, canadense, inglesa, alemã, italiana, francesa, entre outras que lideram nos últimos séculos o ocidente? O que nos torna tão diferentes civilizatoriamente? Por que diante de crises econômicas e políticas como estamos vivenciando, nos deparamos com um distanciamento entre a sociedade brasileira e os poderes constitutivos do Estado brasileiro: executivo, legislativo e judiciário?

  Cotidianamente estamos diante de poderes que tomam decisões que afrontam diretamente os interesses da sociedade brasileira, que por seu turno apresenta-se apática, assistindo aos desmandos, senão a defesa de interesses de grupos que compõem e tencionam as relações de poder entre os três poderes constitutivos da república brasileira.

Ao lançarmos um olhar histórico à conformação societária dos povos acima anunciados nos deparamos com culturas que se caracterizaram, salvaguardadas suas diferenças étnicas, religiosas, econômicas e políticas desde seus primórdios pelo sentimento de pertencimento a terra, a cultura a qual pertenciam.  Talvez se possa dizer que residia em tais povos desde seu primórdios a vontade de pertencer à um determinado território, bem como a vontade de manter e valorizar suas diferenças em relação aos outros povos. Também encontramos nestes povos em suas origens, o respeito as suas tradições, aos seus costumes e leis deles derivados,  bem como a busca da igualdade de condições a partir do qual cada indivíduo pudesse fazer a si próprio.

Nestas culturas, o Estado e suas estruturas estatais é o resultado de disputas seculares envolvendo os interesses da nobreza feudal na conformação de estados absolutistas num primeiro momento, em tensão com a nascente classe dos comerciantes, a burguesia que almejava a construção de estruturas estatais que viabilizassem a garantia da propriedade, da liberdade nos negócios e, dos lucros advindos dos mesmos. É a partir deste longo e conflitivo processo que constituíram as sociedades inglesa, holandesa, francesa, norte-americana, canadense entre outras que lideram o ocidente até os dias atuais.

Porém, quando lançamos um olhar a forma de constituição da sociedade brasileira sobressai a percepção de que nos ressentimos até os dias atuais de pertencimento ao local, a região, ao território que ocupamos.  Desde os primeiros momentos de nossa colonização, o que estava em jogo não era o estabelecimento de vínculos de pertencimento ao solo brasileiro, uma vez que o mesmo era patrimônio da Coroa portuguesa.  O regime de escravidão imposto nestas terras fortaleceu este sentimento de não pertencimento ao solo pátrio. A proliferação de coronéis proprietários de grandes extensões de terra fortaleceu o sentimento de propriedade nas mãos de pequeno grupo de afortunados. Associado à estas condições a miscigenação de culturas as mais diversas, desenraizadas de sua terra de origem e, lançadas em terras que também não lhes pertenciam aprofundou a ausência de pertencimento ao território, bem como a ausência de iniciativas de constituição de um espaço público resultante dos interesses comuns de uma determinada comunidade.

Sob os imperativos da prática de uma cultura patrimonialista, em que terras, riquezas e, tudo o mais presente no território era patrimônio do rei, dos nobres e de seus apadrinhados, ao conjunto da população não sobrou nada mais que lutar pela própria sobrevivência. Constituímo-nos como  sociedade marcada pela desconfiança, por práticas de levar vantagem em tudo, de dar um jeitinho, de contar com a sorte.  Ou mesmo como prática recorrente no dias de hoje de tentar tirar vantagem do erário público. Ou dito de outra forma, nos constituímos como sociedade que não consegue distinguir adequadamente interesses públicos e interesses privados. Tudo se passa como se o governo, os deputados e senadores fossem os proprietários do Brasil e, a sociedade brasileira nada pode fazer diante de disputas de interesses entre os poderes legislativo e executivo.
 
Talvez isto no ajude a compreender por que no atual quadro da crise política e econômica em que estamos inseridos tudo para e, ficamos assistindo ao desdobramento dos acontecimentos na espera de um milagre, ou de que um salvador da pátria aponte o caminho correto a seguir. Em solo tupiniquim tudo depende do Estado. Quando o Estado no desajuste de suas contas demonstra limites em sua capacidade de financiamento nos deparamos como uma sociedade marcada pela ausência de iniciativa, de criatividade e, sobretudo de ausência de força de vontade para superar crises.  O que se manifesta nestes momentos é a impaciência, as agressões verbais, a ofensa as lideranças políticas, aos governantes como únicos responsáveis pelas dificuldades em que nos encontramos inseridos.  O fato de não construirmos um espaço público que garanta a igualdade de condições de fazermos a nós próprios, faz com que dependamos do igualitarismo financiado e promovido pelo Estado e, operacinalizado pelo governo de plantão. Carecemos da condição de conformarmos uma sociedade que expresse uma racionalidade civilizatória, expressa na qualidade de nossas instituições públicas, mas, sobretudo na capacidade de agirmos na defesa dos interesses públicos, que por extensão promoverão a garantia da igualdade de condições e da liberdade de ação dos indivíduos no espaço público.  Este é o caminho necessário para nos constituirmos como civilização, para além de sermos milhões de produtores e meros consumidores desprovidos de racionalidade civilizatória.

 Sandro Luiz Bazzanella
Professor de Filosofia

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