REFLEXÕES SOBRE OS SEIS PRIMEIROS MESES DE 2015.
O QUE NOS TORNA DIFERENTES DOS POVOS DESENVOLVIDOS?
Como
explicar as diferenças entre a sociedade brasileira e sociedades desenvolvidos
como a sociedade norte-americana, canadense, inglesa, alemã, italiana,
francesa, entre outras que lideram nos últimos séculos o ocidente? O que nos
torna tão diferentes civilizatoriamente? Por que diante de crises econômicas e
políticas como estamos vivenciando, nos deparamos com um distanciamento entre a
sociedade brasileira e os poderes constitutivos do Estado brasileiro:
executivo, legislativo e judiciário?
Cotidianamente estamos diante de poderes que tomam decisões que afrontam
diretamente os interesses da sociedade brasileira, que por seu turno
apresenta-se apática, assistindo aos desmandos, senão a defesa de interesses de
grupos que compõem e tencionam as relações de poder entre os três poderes
constitutivos da república brasileira.
Ao
lançarmos um olhar histórico à conformação societária dos povos acima
anunciados nos deparamos com culturas que se caracterizaram, salvaguardadas
suas diferenças étnicas, religiosas, econômicas e políticas desde seus
primórdios pelo sentimento de pertencimento a terra, a cultura a qual
pertenciam. Talvez se possa dizer que
residia em tais povos desde seu primórdios a vontade de pertencer à um
determinado território, bem como a vontade de manter e valorizar suas
diferenças em relação aos outros povos. Também encontramos nestes povos em suas
origens, o respeito as suas tradições, aos seus costumes e leis deles
derivados, bem como a busca da igualdade
de condições a partir do qual cada indivíduo pudesse fazer a si próprio.
Nestas
culturas, o Estado e suas estruturas estatais é o resultado de disputas
seculares envolvendo os interesses da nobreza feudal na conformação de estados
absolutistas num primeiro momento, em tensão com a nascente classe dos
comerciantes, a burguesia que almejava a construção de estruturas estatais que
viabilizassem a garantia da propriedade, da liberdade nos negócios e, dos
lucros advindos dos mesmos. É a partir deste longo e conflitivo processo que
constituíram as sociedades inglesa, holandesa, francesa, norte-americana,
canadense entre outras que lideram o ocidente até os dias atuais.
Porém,
quando lançamos um olhar a forma de constituição da sociedade brasileira
sobressai a percepção de que nos ressentimos até os dias atuais de
pertencimento ao local, a região, ao território que ocupamos. Desde os primeiros momentos de nossa colonização,
o que estava em jogo não era o estabelecimento de vínculos de pertencimento ao
solo brasileiro, uma vez que o mesmo era patrimônio da Coroa portuguesa. O regime de escravidão imposto nestas terras
fortaleceu este sentimento de não pertencimento ao solo pátrio. A proliferação
de coronéis proprietários de grandes extensões de terra fortaleceu o sentimento
de propriedade nas mãos de pequeno grupo de afortunados. Associado à estas
condições a miscigenação de culturas as mais diversas, desenraizadas de sua
terra de origem e, lançadas em terras que também não lhes pertenciam aprofundou
a ausência de pertencimento ao território, bem como a ausência de iniciativas
de constituição de um espaço público resultante dos interesses comuns de uma
determinada comunidade.
Sob
os imperativos da prática de uma cultura patrimonialista, em que terras,
riquezas e, tudo o mais presente no território era patrimônio do rei, dos
nobres e de seus apadrinhados, ao conjunto da população não sobrou nada mais
que lutar pela própria sobrevivência. Constituímo-nos como sociedade marcada pela desconfiança, por
práticas de levar vantagem em tudo, de dar um jeitinho, de contar com a
sorte. Ou mesmo como prática recorrente
no dias de hoje de tentar tirar vantagem do erário público. Ou dito de outra
forma, nos constituímos como sociedade que não consegue distinguir
adequadamente interesses públicos e interesses privados. Tudo se passa como se
o governo, os deputados e senadores fossem os proprietários do Brasil e, a
sociedade brasileira nada pode fazer diante de disputas de interesses entre os
poderes legislativo e executivo.
Talvez
isto no ajude a compreender por que no atual quadro da crise política e
econômica em que estamos inseridos tudo para e, ficamos assistindo ao
desdobramento dos acontecimentos na espera de um milagre, ou de que um salvador
da pátria aponte o caminho correto a seguir. Em solo tupiniquim tudo depende do
Estado. Quando o Estado no desajuste de suas contas demonstra limites em sua
capacidade de financiamento nos deparamos como uma sociedade marcada pela
ausência de iniciativa, de criatividade e, sobretudo de ausência de força de
vontade para superar crises. O que se
manifesta nestes momentos é a impaciência, as agressões verbais, a ofensa as
lideranças políticas, aos governantes como únicos responsáveis pelas
dificuldades em que nos encontramos inseridos.
O fato de não construirmos um espaço público que garanta a igualdade de
condições de fazermos a nós próprios, faz com que dependamos do igualitarismo
financiado e promovido pelo Estado e, operacinalizado pelo governo de plantão.
Carecemos da condição de conformarmos uma sociedade que expresse uma
racionalidade civilizatória, expressa na qualidade de nossas instituições
públicas, mas, sobretudo na capacidade de agirmos na defesa dos interesses
públicos, que por extensão promoverão a garantia da igualdade de condições e da
liberdade de ação dos indivíduos no espaço público. Este é o caminho necessário para nos
constituirmos como civilização, para além de sermos milhões de produtores e
meros consumidores desprovidos de racionalidade civilizatória.
Sandro Luiz Bazzanella
Professor de Filosofia
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