ENTENDA O QUE É A PEC 241 E COMO ELA PODE
AFETAR SUA VIDA
Com o
objetivo de congelar gastos públicos e contornar a crise econômica, proposta
divide especialistas.
São Paulo 13 OUT 2016
A Câmara dos Deputados passou em primeira votação
nesta segunda-feira a proposta de
emenda constitucional que cria uma teto para os gastos públicos, a PEC
241, que congela as despesas do Governo Federal, com cifras corrigidas pela
inflação, por até 20 anos. Com as contas no vermelho, o presidente Michel Temer vê na
medida, considerada umas das maiores mudanças fiscais em décadas, uma saída
para sinalizar a contenção do rombo nas contas públicas e tentar superar a
crise econômica. O mecanismo enfrenta severas críticas da nova oposição,
liderada pelo PT, pelo PSOL e pelo PCdoB, mas também vindas de parte dos
especialistas, que veem na fórmula um freio no investimento em saúde e educação
previstos na Constituição. O texto da emenda, que precisa ser aprovado em uma
segunda votação na Câmara e mais duas no Senado, também tem potencial para
afetar a regra de reajuste do salário mínimo oficial. Veja como foi a votação
nesta segunda aqui.
Entenda o que é a proposta e suas principais consequências.
O
que é a PEC do teto de gastos?
A
PEC, a iniciativa para modificar a Constituição proposta pelo Governo, tem como
objetivo frear
a trajetória de crescimento dos gastos públicos e tenta equilibrar as contas públicas.
A ideia é fixar por até 20 anos, podendo ser revisado depois dos primeiros dez
anos, um limite para as despesas: será o gasto realizado no ano anterior
corrigido pela inflação (na prática, em termos reais - na comparação do que o
dinheiro é capaz de comprar em dado momento - fica praticamente congelado). Se
entrar em vigor em 2017, portanto, o Orçamento disponível para gastos será o
mesmo de 2016, acrescido da inflação daquele ano. A medida irá valer para os
três Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário. Pela proposta atual, os
limites em saúde e educação só começarão a valer em 2018.
Por
que o Governo diz que ela é necessária?
O
ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, diz que "não há possibilidade de
prosseguir economicamente no Brasil gastando muito mais do que a sociedade pode
pagar. Este não é um plano meramente fiscal." Para a equipe econômica,
mesmo sem atacar frontalmente outros problemas crônicos das contas, como a
Previdência, o mecanismo vai ajudar "a recuperar a confiança do mercado, a
gerar emprego e renda" ao mesmo tempo em que
conterá os gastos públicos, que estão crescendo ano a ano, sem serem
acompanhados pela arrecadação de impostos. Para uma parte dos especialistas,
pela primeira vez o Governo está atacando os gastos, e não apenas pensando em
aumentar as receitas. O Governo Temer não cogita, no momento, lançar mão de
outras estratégias, como aumento de impostos ou mesmo uma reforma tributária,
para ajudar a sanar o problema do aumento de gasto público no tempo.
O
que dizem os críticos da PEC?
Do
ponto de vista de atacar o problema do aumento anual dos gastos públicos, uma
das principais críticas é que uma conta importante ficou de fora do pacote de
congelamento: os gastos com a Previdência.
É um segmento que abocanha
mais de 40% dos gastos públicos obrigatórios.
Logo, a PEC colocaria freios em pouco mais de 50% do Orçamento, enquanto que o
restante ficaria fora dos limites impostos - só a regra sobre o salário mínimo
tem consequências na questão da Previdência. A Fazenda afirmou, de todo modo,
que a questão da Previdência será tratada de forma separada mais à frente.
"Se não aprovar mudanças na Previdência, um gasto que cresce acima da
inflação todos os anos, vai ter de cortar de outras áreas, como saúde e
educação", diz Márcio Holland, ex-secretário de política econômica da
Fazenda. "Nesse sentido, a PEC deixa para a sociedade, por meio do
Congresso, escolher com o que quer gastar", complementa. Há vários
especialistas que dizem que, na prática, o texto determina uma diminuição de
investimento em áreas como saúde e educação, para as quais há regras
constitucionais. Os críticos argumentam que, na melhor das hipóteses, o teto
cria um horizonte de tempo grande demais (ao menos dez anos) para tomar
decisões sobre toda a forma de gasto do Estado brasileiro, ainda mais para um
Governo que chegou ao poder sem ratificação de seu programa nas urnas. Eles
dizem ainda que, mesmo que a economia volte a crescer, o Estado já vai ter
decidido congelar a aplicação de recursos em setores considerados críticos e
que já não atendem a população como deveriam e muito menos no nível dos países
desenvolvidos. Se a economia crescer, e o teto seguir corrigido apenas de
acordo com a inflação, na prática, o investido nestas áreas vai ser menor em
termos de porcentagem do PIB (toda a riqueza produzida pelo país). O
investimento em educação pública é tido como um dos motores para diminuir a
desigualdade brasileira.
Quando
a PEC começa a valer?
Se
aprovada na Câmara e no Senado, começa a valer a partir de 2017. No caso das
áreas de saúde e educação, as mudanças só passariam a valer após 2018, quanto
Temer não será mais o presidente.
Qual
o impacto da PEC no salário mínimo?
A
proposta também inclui um mecanismo que pode levar ao congelamento do valor do
salário mínimo, que seria reajustado apenas segundo a inflação. O texto prevê
que, se o Estado não cumprir o teto de gastos da PEC, fica vetado a dar aumento
acima da inflação com impacto nas despesas obrigatórias. Como o salário mínimo está
vinculado atualmente a benefícios da Previdência, o aumento real ficaria
proibido. O Governo tem dito que na prática nada deve mudar até 2019, data
formal em que fica valendo a regra atual para o cálculo deste valor, soma a
inflação à variação (percentual de crescimento real) do PIB de dois anos antes. A
regra em vigor possibilitou aumento real (acima da inflação), um fator que
ajudou a reduzir o nível de desigualdade dos últimos anos.
O
que acontece se a PEC for aprovada e o teto de gastos não for cumprido?
Algumas
das sanções previstas no texto da PEC para o não cumprimento dos limites inclui
o veto à realização de concursos públicos, à criação de novos cargos e à
contratação de pessoal. Em outras palavras, pretende ser uma trava muito mais
ampla que a Lei de Responsabilidade Fiscal, por exemplo, que cria um teto de
gastos com pessoal (vários
Estados e outros entes a burlam atualmente).
A
PEC do teto vale para os Estados também?
A
PEC se aplicará apenas aos gastos do Governo Federal. No entanto, a secretária
do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, já sinalizou que o Planalto deve
encaminhar em breve uma segunda PEC que limita os gastos estaduais. Por
enquanto não há consenso entre o Executivo Federal e os governadores sobre o
assunto.
Quais
impactos a PEC pode ter nas áreas de educação e saúde?
Os críticos afirmam
que a PEC irá colocar limites em gastos que historicamente crescem todos os
anos em um ritmo acima da inflação, como educação e saúde. Além disso, gastos
com programas sociais também podem ser afetados pelo congelamento. Segundo
especialistas e entidades setoriais, esta medida prejudicaria o alcance e a
qualidade dos serviços públicos oferecidos. Especialistas apontam problemas
para cumprir mecanismos já em vigor, como os investimentos do Plano Nacional de
Educação. Aprovado em 2014, o PNE tem metas de universalização da educação e
cria um plano de carreira para professores da rede pública, uma das categorias
mais mal pagas do país. "A população brasileira está envelhecendo. Deixar
de investir na educação nos patamares necessários, como identificados no PNE,
nos vinte anos de vigência da emenda proposta – tempo de dois PNEs -, é
condenar as gerações que serão a população economicamente ativa daqui vinte
anos, a terem uma baixa qualificação", disse o consultor legislativo da
Câmara dos Deputados, Paulo Sena, ao site Anped, que
reúne especialistas em educação.
Já o ministro da
Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que mais importante do que o valor
despendido com áreas como saúde, educação e segurança, é a qualidade desses
gastos. "Dados da educação e da saúde hoje mostram que a alocação de
recursos não é o problema. É preciso melhorar a qualidade do serviço prestado à
população", disse. "Teremos muito trabalho. O principal deles será o
de mostrar que a saúde e educação não terão cortes, como a oposição tenta fazer
a população acreditar", afirmou a líder do Governo no Congresso, a senadora
Rose de Freitas (PMDB-ES).
A
PEC do teto atingirá de maneira igual ricos e pobres?
A população mais
pobre, que depende do sistema público de saúde e educação, tende a ser mais
prejudicada com o congelamento dos gastos do Governo do que as classes mais
abastadas. A Associação Brasileira de Saúde Pública, por exemplo, divulgou
carta aberta criticando a PEC. No documento a entidade afirma que a proposta
pode sucatear o Sistema Único de Saúde, utilizado principalmente pela população
de baixa renda que não dispõe de plano de saúde. Além disso, de acordo com o
texto da proposta, o reajuste do salário mínimo só poderá ser feito com base na
inflação - e não pela fórmula antiga que somava a inflação ao percentual de
crescimento do PIB. Isso atingirá diretamente o bolso de quem tem o seu ganho
atrelado ao mínimo.
Por
que a Procuradoria Geral da República diz que é inconstitucional?
Em nota técnica
divulgada em 7 de outubro o órgão máximo do Ministério Público Federal afirmou
que a PEC é inconstitucional. De acordo com o documento, "as alterações
por ela pretendidas são flagrantemente inconstitucionais, por ofenderem a
independência e a autonomia dos Poderes Legislativo e Judiciário e por
ofenderem a autonomia do Ministério Público e demais instituições
constitucionais do Sistema de Justiça [...] e, por consequência, o princípio
constitucional da separação dos poderes, o que justifica seu
arquivamento". A crítica vem pela criação de regras de gastos para os
demais Poderes. Na nota, a procuradoria argumenta que, caso aprovada, a PEC irá
prejudicar a “atuação estatal no combate às demandas de que necessita a
sociedade, entre as quais: o combate à corrupção; o combate ao crime; a atuação
na tutela coletiva; e a defesa do interesse público". A Secretaria de
Comunicação Social da Presidência rebateu a PGR, afirmando que na proposta não
existe “qualquer tratamento discriminatório que possa configurar violação ao
princípio da separação dos poderes".
O
que vem depois da PEC, se ela for aprovada tal como está?
A PEC é a prioridade
da equipe econômica do Governo Temer, que vai pressionar por outras reformas
nos próximos meses, como a Reforma da Previdência e Reforma Trabalhista.
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